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EMPREENDER É PRECISO

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Atualizado: 13 de fev. de 2023

A desigualdade de gênero no mercado de trabalho é agravada por conta da raça; embora sejam maioria, mulheres negras raramente ocupam postos de liderança. Um caminho encontrado pelo público feminino contra essa situação está na abertura do negócio próprio, movimentando a economia a seu favor


Por Andreina Moreira




Imagem/Reprodução: Pixabay

Pense em uma mulher empreendedora de sucesso ou em cargo de liderança na iniciativa privada. A mulher que você pensou é negra? Nãose espante se esse questionamento torna-se um desafio. O motivo é claro: os quadros de liderança estão, boa parte, ocupados por homens brancos.

Nas oportunidades de postos de trabalho, as mulheres negras sofrem sob duas óticas, gênero e etnia. Ainda que elas sejam o maior grupo demográfico do país, representando 28,4% da população total, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) feita em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), não são as mulheres negras a configurarem o topo da lista das lideranças de sucesso.


Essa condição vem de longa data. A construção brasileira reflete a forma que o imaginário coletivo se lembra da mulher negra: como doméstica e não como líderes de mercado. O contexto socioeconômico tem raízes históricas. Quando o Brasil ainda era uma colônia, as mulheres negras tinham a mesma valia de um homem negro no trabalho. Afinal, todas e todos formavam uma população de negros escravizados. Nada de sexo frágil ou delicadezas, as mulheres escravizadas eram vistas nas lavouras, cuidando dos afazeres da casa, lavando roupas à beira do rio e em tantas outras atividades. Para além do serviço braçal, eram elas a cuidar dos filhos das mulheres brancas, educar, amar. Seus corpos eram vistos apenas na condição de serviçais e reprodutores.

Séculos depois, as marcas da colonização perpetuam na imagem da mulher negra no consciente brasileiro. Essa percepção é confirmada pela explicação da doutora em economia e pesquisadora na área de mercado de trabalho, educação e desigualdades sociais no Instituto Brasileiro de Economia (IBRE), unidade Fundação Getúlio Vargas, Janaína Feijó.


“A situação da mulher negra é muito delicada, porque nós temos ao longo da vida disparidades que começam desde criança e vão se acentuando entre os indivíduos pobres e ricos. Mas pelo fato de a maior parte da população negra estar em condição vulnerável, isso faz com que ela tenha menos oportunidades e essas poucas oportunidades tendem a se perpetuar por toda vida. Se comparar uma mulher negra e um homem branco no início da vida, você vai ver que eles estão em contextos muito diferentes e, quando esses indivíduos vão crescendo, os caminhos vão se afastando cada vez mais”, avalia.

Para Janaína, as oportunidades oferecidas a esses dois grupos, considerando gênero e raça, são bastante desiguais diante do que é mais valorizado nas contratações, a capacitação. “O nível educacional alto, pessoas que têm principalmente alguma habilidade voltada mais para as exatas, facilidade de se comunicar, de liderar, mas para a mulher negra, que vem de um contexto muito desfavorável e tem tido acesso a uma educação de baixa qualidade, a probabilidade é que ela não tenha essas skills. Então quando chega lá no mercado de trabalho a competitividade é muito desleal, fazendo com que ela não consiga galgar altas posições”, completa a economista.

Em 2022, uma pesquisa feita por Janaína Feijó, considerando um grupo de pessoas com altos salários, revelou que apenas 9% dos que tinham o rendimento superior a R$ 5 mil reais eram mulheres negras. Os dados demonstram o quanto é difícil para esse grupo avançar em postos de trabalho e remuneração.



Evolução da representatividade das mulheres negras entre os 10% com maiores rendimentos do trabalho (1º tri de cada ano)


Imagem/Reprodução: Site FGV

Para reverter esse quadro, Janaína aposta em políticas públicas afirmativas como a das cotas. Segundo ela, é necessário pensar em políticas a curto, médio e longos prazos. Nesse último, a educação confirma seu papel indispensável: os bons índices de escolaridade são fruto de programas perenes e basilares. Por outro lado, a curto prazo, os programas trainees são fundamentais para capacitar mulheres negras para o mercado de trabalho e contribuir para que elas permaneçam na empresa por um longo período. A médio prazo, a economista ressalta a questão sobre gênero e a precisão do combate aos estereótipos, tirando a visão sobre o senso comum de que há uma limitação de espaços para que as mulheres possam ocupá-los.



“Quantas mulheres negras poderiam ser beneficiadas e poderiam contribuir nas empresas? São pessoas que têmpotenciais e, pelas circunstâncias da vida, esses potenciais podem nunca ser revelados” - Janaína Feijó, pesquisadora da FGV



Ela ainda ressalta a responsabilidade do Governo Federal em relação às políticas públicas. “O Governo Federal precisa voltar a fazer programas de requalificação, porque o mercado de trabalho está a todo tempo mudando. Então, pode ser que a pessoa que fez o curso de confeiteiro, talvez já não consiga emprego de confeiteiro porque a demanda do mercado já não é mais essa. Então o que ela faz? Ela não consegue emprego e vai ficar em casa. O Governo Federal precisa entender as demandas do mercado e ofertar cursos alinhados aos dilemas que essas mulheres enfrentam. Por isso, dizemos que a política pública tem que ser bem desenhada, entendendo o contexto dessas mulheres”, defende. Ela conclui destacando a necessidade de a mulher negra estar ativa no mercado de trabalho, uma vez que esse capital humano pode colaborar com o crescimento econômico do país.



NEGRA, SIM! EMPREENDEDORA, TAMBÉM!


Se as oportunidades não são oferecidas, elas podem (e são) buscadas. A falta de receptividade do mercado de trabalho faz com que as mulheres negras busquem demarcar o seu espaço e, graças a esforços próprios, passem a ocupar posições que antes lhes foram negadas. Há um movimento espontâneo e necessário acontecendo no qual mulheres negras estão se tornando empreendedoras. Elas abrem portas para que outras pessoas negras tenham voz e espaço no mercado de trabalho.

Fernanda Aguiar de Meneses, 23, empresária e trancista no Nanda’s Afro Hair (@nandaafrohair), não poupa palavras ao afirmar que a caminhada para a construção da empresa foi cheia de adversidades.


Acervo pessoal de Fernanda Aguiar Meneses
“Eu amo trabalhar com a autoestima, principalmente a da mulher preta. Cada pessoinha que se senta na minha cadeira tem uma história de vida diferente, um sofrimento diferente. Émuito bom ajudá-la a se sentir mais bonita”, - Fernanda Aguiar, trancista

“A loja começou em Taguatinga (DF) numa parede Da loja de cestas da minha mãe em 2019. Você olhava pra um lado e tinha cabelo, olhava pro outro e era um mundo cesta, as clientes ficavam super confusas e tudo foi muito bom”, lembra entre risadas. “Empreender é difícil. Comecei aos 19 anos com ajuda financeira dos meus pais. No início é muito difícil. O público também não é fácil, já fui roubada no meu estabelecimento, por exemplo, e me senti desmotivada. Mas o amor que eu tenho por tranças e a alegria de conhecer cada mulher que entra na minha loja me move cada dia mais”, avalia.

A empreendedora, já pôde ajudar outras mulheres negras, o que para ela é recompensador. “Quando eu comecei com o studio, conheca uma moça que não tinha condição alguma de pagar para colocar o cabelo. Lembro que na época ela usava um tufo de cabelo como rabo de cavalo, mas não ficava legal e muita gente ria dela. Conversei com ela e a orientei sobre como deixar o seu cabelo de uma forma quue a fizesse se sentir melhr. Quando finalizamos a aplicação o sorriso no rosto era evidente, a felicidade dela de poder se olhar no espelho novamente e gostar do que via, foi gratificante. E como ela não tinha condições financeiras para arcar com os custos de cuidar do cabelo, eu fiz uma cesta com produtos e a presenteei ”, conta satisfeita.


"Tudo, tudo, tudo que 'nóis' tem é 'nóis'"


Sabendo dessa barreira entre o mercado de trabalho e as mulheres negras, por onde começar? Há uma série de comunidades para que esse grupo possa iniciar a sua carreira, ter um lugar de acolhimento ou ainda se capacitar para atuar na área que deseja.

O Movimento Black Money é, como eles mesmos se definem, “um hub de inovação que cria e reexiste”. A ideia é inserir a comunidade negra na era digital atrelada à transformação do ecossistema do empreendedor negro. De que maneira? A partir desse ecossistema que tem os recursos necessários, para possibilitar o crescimento e valorizar os negros. A CEO do Movimento Black Money, Nina Silva (@ninasilvaperfil), oferece direcionamentos e informação para que os negros possam se empoderar.

O PretaLab é uma comunidade que conecta mulheres negras na área de tecnologia. Ele surgiu em 2017 com a proposta de criar uma rede de mulheres negras no campo tecnológico. A entidade oferece formação educacional, consultorias sobre diversidade para empresas e conta com um banco de talentos formado por mulheres negras de todo o país, com o foco na tecnologia. PretaLab é fruto do Olabi, uma organização sem fins lucrativos que cria projetos pensando na diversidade, inclusão e ética.


Imagem/Reprodução: Site PretaLab

O Instituto Identidades do Brasil (ID_BR) também é uma instituição sem fins lucrativos que pensa na população negra. Seu maior compromisso é com a aceleração da promoção da igualdade racial, a partir de diferentes ações que incluem o engajamento e a conscientização de organizações e da sociedade.



Imagem/Reprodução: Site ID_BR



Outra comunidade para se sentir acolhido é a Indique uma preta. A organização já trabalhou com mais de 70 empresas, dentre elas Meta, Magalu e o Grupo Boticário. Apesar de atuarem como uma empresa de consultoria, no Instagram (@indiqueumapreta) é possível encontrar diversas vagas voltadas para a população negra.


A Startup Negras Plurais desempenha o papel de ponte entre mulheres negras e norte de diversidade para as empresas. Pensando em relacionamento, conexão e experiência, trazem atividades cada vez mais inclusivas e inspiradoras. O acesso à startup é pelo Instagram @negrasplurais onde é possível acompanhar as realizações da empresa.

Todas as empresas contam com perfil no Instagram. Basta acessar e começar a imersão agora mesmo. Se as oportunidades não são dadas, elas são conquistadas. Como disse a filósofa norte-americana, Angela Davis: "Quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela".




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